Marcos Gouvêa de Souza de Marcos Gouvêa de Souza

Confiança do consumidor, renda, emprego e crédito são os quatro principais fatores que determinam a intenção de consumo e, portanto, o comportamento de compras e as vendas no varejo. O mais sensível desses, por conta de sua volatilidade e imprevisibilidade, é a confiança do consumidor. E pode ser muito afetado pelo comportamento da seleção brasileira no catártico período da Copa do Mundo de futebol.

Sua medida no Brasil é feita pela FGV (Fundação Getulio Vargas) e seus resultados, divulgados mensalmente, retratam a percepção dos consumidores sobre a realidade presente e futura e o índice final é resultado da combinação desses dois fatores.

E sua volatilidade e imprevisibilidade estão associadas ao fato de que são percepções a partir de tudo que envolve a realidade destilada pelo sentimento individual das pessoas, de todas as classes sociais, regiões geográficas, faixas etárias e níveis de renda. Isso é sinalizado na queda para 85,3 no índice de novembro, 3,3 abaixo que em outubro e praticamente a metade do que era no início de 2013.

É desta forma, com ampla diversidade perceptiva, que a constância da amostra e a metodologia permitem acompanhar ao longo do tempo e correlacionar, explicando, mas não antecipando, comportamentos.

Com algumas importantes exceções, como é o caso da Copa do Mundo.

Não precisa nenhum embasamento muito técnico e metodológico para relacionar o aumento de consumo, compras e vendas no varejo caso a seleção brasileira continue avançando no Mundial. Tanto quanto um fracasso pode fazer desabar a confiança, especialmente aquela relacionada ao sentimento mais imediato, de curto prazo. E fracasso, no caso passional brasileiro, é tudo aquilo que não seja ganhar a Copa, não importando qualquer outra classificação.

Neste ano, a combinação de fatores torna tudo mais intenso, pois convergiram o período promocional da Black Friday com o início da Copa do Mundo. O bom desempenho logo no primeiro jogo, as intensas e empolgantes campanhas promocionais e publicitárias sendo veiculadas e um certo sentimento de que o pior período da pandemia ficou para trás.

Se analisarmos o comportamento da confiança do consumidor brasileiro nos últimos 10 anos, vamos perceber que os índices oscilando entre 160-165, que foram alcançados no final de 2012 e início de 2013, não voltaram a se repetir e, como se imagina, o período da covid-19 só deprimiu os resultados.

Uma leve e oscilante recuperação começou pós-pandemia, mas ainda em patamares muito inferiores ao passado.

Um elemento importante na percepção da confiança é a inflação, em particular a dos alimentos, que tem forte impacto, em especial nas classes mais baixas, e contamina o índice como um todo. Como sabido, o comportamento recente desse indicador teve forte impacto quando conjugado com a redução da renda real e o desemprego, que mantiveram os índices bastante baixos nos dois últimos anos.

A redução da inflação mais recentemente; a recuperação do emprego, com redução de desemprego; o crescimento da renda real e a retomada da economia, mesmo com os elevados níveis de inadimplência de curto e médio prazos, como foi vivenciado ao longo do ano, criaram um clima mais positivo.

Este clima, porém, foi contaminado pela polarização no plano político, que não criou o melhor cenário para o aumento do consumo de forma ampla. E acabou concentrando seus melhores resultados no conhecido varejo de valor, aquele privilegiado pelas classes mais baixas, que determina o comportamento geral das vendas do varejo como um todo.

Sem adicionar elementos ligados ao cenário político, mas considerando esse particular momento em que um novo governo está prestes a assumir e já se sabe que a componente social será privilegiada com manutenção de programas de auxílios.

A continuidade da redução da inflação, o desemprego caminhando para continuar sua queda, os problemas gerados pela inadimplência tendendo a se diluir, como resultado da combinação dos outros elementos, casados com o forte impacto dos apelos publicitários e promocionais da Copa e do final de ano, além do 13º e outros apelos, devem criar um clima positivo no curto prazo, impactando e sendo impactado pelo nível de confiança.

O avanço positivo da seleção, tema dominante fora do campo político, mas também impactado por ele, pode, eventualmente, permitir voltar aos patamares de 2012-2013, que trariam um clima quase mágico momentaneamente para o mercado com seus impactos positivos para o varejo e o consumo.

A história se repete? Vamos torcer.

É momento da Copa e o tempo dirá.

Marcos Gouvêa de Souza é fundador e diretor-geral da Gouvêa Ecosystem e publisher da plataforma Mercado&Consumo.